Imaginarium

Imaginarium

Por Antônio de Oliveira

Virgílio louva o homem do campo para quem são destituídas de valor as questões públicas e os reinos destinados a perecer. No original: “non res Romanae perituraque regna”.

Hoje, uma imagem insólita, objeto de nostalgia. Modernizada, a fazenda se descaracterizou. Gado de raça, de cocheira; eletrificação, inseminação artificial, manejo de pastagens, ordenha mecânica, camionetas, tratores, registros computadorizados. Tudo, enfim, que traz conforto, racionaliza o trabalho, aumenta a produção, mas desafia, enfrenta, desfigura o sertão.

Para João Guimarães Rosa, “Sertão é dentro da gente”, símbolo de troca de senha, apenas. Sertão dentro de mim, sem fim, até o fim, até os confins. O sertão é do tamanho do meu mundo. Sim, amparado por Carlos Drummond de Andrade, posso sempre ter, como Um chamado João: pastos, buritis plantados em apartamento, no peito.

Na década dos 40 esse panorama de interior mineiro era diferente. Fazenda antiga, casarão; terra batida, nua, dura e seca pela força dos cascos dos animais, grandes currais divididos pelos pastos. Pastagens extensas, gado solto: nelore, guzerá, caracu, mestiço. À sombra de árvores esparsas, reses ruminando; touros selvagens, em liberdade, alheios à própria imponência, descansados. Dos janelões da casa grande, fincada num pé de serra, uma paisagem descontraída: “Enquanto pasta alegre o manso gado / Minha bela Marília…” Continua o inconfidente Tomás Antônio Gonzaga: ““Atende, como aquela vaca preta / O novilhinho seu dos mais separa / E o lambe, enquanto chupa a lisa teta”.

Cai o pano. Rangido, batido da porteira. Taramela. Cerra-se a memória. O moinho não é mais moinho. O sussurro da água se foi. Ou a vida é um moinho, dentro da gente? Mói, mói, mói, até parar. Tritura. Só não mói minha fé. Trocando o sertão por moinho, levo um moinho dentro de mim. Esta vida não será mesmo um moinho? Dom Quixote a combater moinhos de vento como se fossem gigantes de braços enormes.

Autor: O professor Antônio de Oliveira, cronista fascinante, é Mestre em Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma, na Itália. Licenciado em Letras e em Estudos Sociais pela Universidade de Itaúna; em Pedagogia e em Filosofia pela Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras de São João del Rei. Estágio Pedagógico na França. Contato: [email protected]

Imagem: sxc.hu

Thomas Agnus https://www.duniverso.com.br/

Autor do livro “O Emburrecimento do Mundo – Dicas Para Extinguir Uma Raça”, lançado pela Editora Viseu. Fundei o Portal Duniverso em 2009, iniciando minha saga como escritor.
P.S.: Nem todos os artigos são de minha autoria. No final de cada um encontra-se o nome do autor.

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